sábado, 27 de dezembro de 2008

As Grutas

















O esplendor poisava solene sobre o mar. E – entre as duas pedras erguidas numa relação tão justa que é talvez ali o lugar da Balança onde o equilíbrio do homem com as coisas é medido – quase me cega a perfeição como um sol olhando de frente. Mas logo as águas verdes em sua transparência me diluem e eu mergulho tocando o silêncio azul e rápido dos peixes. Porém a beleza não é solene mas também inumerável. De forma em forma vejo o mundo nascer e ser criado. Um grande rascasso vermelho passa em frente de mim que nunca antes o imaginara. Limpa, a luz recorta promontórios e rochedos. É tudo igual a um sonho extremamente lúcido e acordado. Sem dúvida um novo mundo nos pede novas palavras, porém é tão grande o silêncio e tão clara a transparência que eu muda encosto a minha cara na superfície das águas lisas como um chão. As imagens atravessam os meus olhos e caminham para além de mim. Talvez eu vá ficando igual à almadilha da qual os pescadores dizem ser apenas água. Estarão as coisas deslumbradas de ser elas? Quem me trouxe finalmente a este lugar? Ressoa a vaga no interior da gruta rouca e a maré retirando deixou redondo e doirado o quarto de areia e pedra. No centro da manhã, no centro do círculo do ar e do mar, no alto do penedo, no alto da coluna está poisada a rola branca do mar. Desertas surgem as pequenas praias.











Eis o mar e a luz vistos por dentro. Terror de penetração na habitação secreta da beleza, terror de ver o que nem em sonhos eu ousara ver, terror de olhar de frente as imagens mais interiores a mim do que o meu próprio pensamento. Deslizam os meus ombros cercados de água e plantas roxas. Atravesso gargantas de pedra e a arquitectura do labirinto paira roída sobre o verde. Colunas de sombra e luz suportam céu e terra. As anémonas rodeiam a grande sala de água onde os meus dedos tocam a areia rosada do fundo. E abro bem os olhos no silêncio líquido e verde onde rápidos, rápidos fogem de mim os peixes. Arcos e rosáceas suportam e desenham a claridade dos espaços matutinos. Os palácios do rei do mar escorrem luz e água. Esta manhã é igual ao princípio do mundo e aqui eu venho ver o que jamais se viu. O meu olhar tornou-se liso como um vidro. Sirvo para que as coisas se vejam. E eis que entro na gruta mais interior e mais cavada. Sombrias e azuis são águas e paredes. Eu quereria poisar como uma rosa sobre o mar o meu amor neste silêncio. Quereria que o contivesse para sempre o círculo de espanto e de medusas. Aqui um líquido sol fosforescente e verde irrompe dos abismos e surge em suas portas. Mas já no mar exterior a luz rodeia a Balança. A linha das águas é lisa e limpa como um vidro. O azul recorta os promontórios aureolados de glória matinal. Tudo está vestido de solenidade e de nudez. Ali eu quereria chorar de gratidão com a cara encostada contra as pedras.

Sophia de Mello Breyner

quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

O presépio













Foi de uma história breve
Quando mãos de criança
Colocaram ao de leve

Para todos (eles)
-Boas Festas.

Fotografia e texto: Maremfrente.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

Ao pai Natal
















Olá!
Há muito que te não escrevo. Nem sei se algum dia o fiz há muito muito tempo. Lembro-me, isso sim, de ter deixado um qualquer rascunho em teu nome no verso solto de uma página em branco.

...
 Guardar faz-nos bem porque não está escondido. O que se esconde perde-se porque não se sabe quando, não se imagina como, nem se vislumbra onde. É como o anónimo de quem passa, que o antónimo, esse, nunca foi o teu nome. Por isso, nunca o poria em um sobrescrito qualquer.
...
Fotografia e texto: Maremfrente.

sábado, 20 de dezembro de 2008

sábado, 13 de dezembro de 2008

Sentidos















Fora do tempo
A vida corre serena
Em compasso lento
Em harmonia plena!

Maria de lava
Sob o céu, ora!
Na erva, só
O cavalo devora.
(T)

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Advento















Por entre assombros
Dos escombros
Que se levante
O Levante

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Amar















Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: Aqui… além…
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente…
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder…pra me encontrar…

Florbela Espanca

domingo, 7 de dezembro de 2008

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Ilha(s)















Encontros
sem portas sem pontes
Horizontes
tocados de infinito

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Restauração...















... e a célebre frase de Ciprião de Figueiredo.

Mutações














O lago flutua consigo
enquanto o tempo permanece
o mar reunido
o vento dividido